sábado, 6 de fevereiro de 2010

2009 - Antes da Ucrânia veio a África



Projeto Hope Angola

A cidade de Luanda tem cerca de 120 igrejas e nesta ocasião, apesar da pobreza da região, somente a Associação do Norte da Angola já tinha vendido 3000 antenas para membros e não membros da igreja. O interessante é que a TV Novo Tempo era uma das únicas em português à disposição através de um receptor sem necessidade de pagar qualquer tipo de assinatura. Nós confirmaríamos alguns meses depois como a Novo Tempo se tornou popular na Angola.
Obter os vistos para entrarmos na Angola foi uma verdadeira aventura. Dezenas de e-mails foram enviados para lá e para cá. Mas no dia primeiro de janeiro lá estávamos, eu e a Larissa, prontos para a viagem para a África. Infelizmente o visto do David não havia ficado pronto e tivemos que ir sem ele. David você fez muita falta.
Viajamos no dia primeiro de Janeiro, uma quinta-feira. Nosso avião nos levou primeiro para Johanesburgo, África do Sul, e então, para Luanda, capital da Angola.

Pr. Teixeira Vinte à direita da Larissa

A viagem foi tranqüila e fomos recebidos pelo Pr. Teixeira Vinte, o responsável pelo departamento de comunicação na região, e outros amigos que faríamos na Angola. Fomos levados para o que eles chamam de “Casa de Passagem da União Angolana”. Uma espécie de casa para hóspedes da União em Luanda.

Andar por Luanda é uma aventura. As ruas sempre estão apinhadas de gente e de automóveis. Os automóveis mais caros do planeta contrastam com sinais de pobreza extrema.  E o nosso motorista nos levava por atalhos e ruas esburacadas para fugir do trânsito intenso.
            Algumas coisas nos chamaram a atenção além dos buracos nas ruas: a quantidade de lixo na maior parte dos lugares e preço exorbitante de tudo. Saberíamos, naquela semana, que Luanda havia se tornado a cidade mais cara de todo o planeta. De fato, o meu lanche no shopping Center local, uma pizza bem pequena, uma garrafinha de água mineral e uma latinha de suco custaram cerca de U$ 30,00. A irmã Kandus já nos havia alertado sobre esse problema que enfrentaríamos.
            Apesar de alguns problemas, como a falta de luz à noite e a falta de água durante o dia, todos tentavam nos deixar mais felizes e nos atender no que fosse possível. O Dr. Paiva, seu filho Oswaldo, o irmão João, o Pr. Vinte e todos os seus auxiliares foram maravilhosos tentando solucionar os problemas.
            O que me chamava a atenção é que sempre que perguntávamos sobre a solução de algum dos problemas, invariavelmente a resposta era: “Estamos a trabalhar nisto. Isto não é problema. Está controlado.”
            Mas o problema era que normalmente não estava tão controlado assim.
            Estávamos na Angola e a Kandus não. E os telefonemas iam e vinham, porque ela estava na África do Sul com o equipamento, mas queria ter certeza de que entraria com todo esse equipamento na Angola. O projeto todo corria risco de não acontecer. Sem equipamento não se grava nada. E o pior, ela estava sem o visto de entrada para a Angola.
Todos países tem suas leis e burocracias e com a Angola não é diferente. Como fazer entrar no país cerca de 400 kg de equipamentos sem pagar uma série de taxas?
No sábado fomos levados cada um para uma igreja diferente. Eu pregaria em uma igreja e a Larissa em outra. Na Angola, as irmãs tem que usar uma espécie de paletó ou casaco para pregar e apesar do calor intenso de Luanda, Larissa teve que usar o seu paletó vermelho. Esse paletó se tornaria famoso, pois ela só tinha levado esse “filho único” e ele seria usado todos os sábados que passamos na Angola.

Eu descobri que não tinha levado nenhuma gravata e tive que emprestar uma de um bom irmão. Era uma gravata cor-de-rosa. Eles gostam muito da cor rosa. Vemos casas cor-de-rosa, camisas cor-de-rosa e claro (...) gravatas cor-de-rosa. Essa seria minha gravata todos os sábados que passei na Angola,não importando a cor da camisa.

Em frente do prédio da Associação em Luanda com a 
cor favorita dos angolanos: cor de rosa

O Sábado em que os “putos” morreram
Sábado à tarde, depois do culto, o Pr. Vinte nos convidou para visitar alguns acampamentos de férias. Na viagem de carro pudemos ver tanques que foram usados durante a guerra. Agora, felizmente, desativados, e abandonados à beira da estrada.
Chegamos ao primeiro acampamento e ficamos sabendo que dois rapazes haviam morrido afogados naquele dia. Na verdade, os corpos ainda estavam lá. Preferi não ver.
Percebi que algumas coisas na Angola realmente eram muito diferentes do Brasil. Uma das coisas que notei é que as pessoas não pareciam chocadas com as mortes.
E logo alguém disse:
_Pr. Vinte, foi aqui que os “putos” morreram. Foi dito a eles que não fossem mais para lá, mas eles desobedeceram. E por isso esses “putos” morreram. Os rapazes deveriam banhar-se aqui e as moças lá do outro lado.
Duas coisas me chamaram a atenção: primeiro o fato de eles chamarem os rapazes que morreram de “putos”. Para mim era uma falta de respeito total. E a outra coisa era a separação para os rapazes banharem-se em locais separados das mulheres.
Não! Eu não era contra separar os rapazes e moças, afinal é assim em qualquer lugar do mundo.
O problema é que a separação deveria ter no máximo uns 50 metros e eu podia ver as moças seminuas banhando-se no rio. Grande separação! Mas, cada lugar tem seus costumes e eles têm os deles também.
Ah! “Putos” não tem nada a ver com o significado da palavra no Brasil. Putos em angola significa rapazes. Ufa!
Fomos para outro acampamento. Chegamos à tardinha e muitos vieram nos receber. Ali estava o tesoureiro da União Angolana que alguns chamavam em tom fraterno de “Tijolí”. Seria Tio Jolí, mas eles abreviavam tudo. No final alguns me chamariam de “Tijonatan”.
Ficamos um pouquinho ali e fomos para o outro acampamento. Chegamos lá já era noite. Mas bastou um pouquinho de luz e os rapazes e moças nos reconheceram: a Larissa do Código Aberto e Jonatan Conceição das Lições.

Larissa do Código Aberto sendo carinhosamente recebida no 
acampamento em dia de chuva e de alegria.

Pr. Jonatan das Lições, como me apresentavam.

Foi uma noite diferente dentro daquele país africano.
Mas, enquanto isso, na África do Sul, e os equipamentos?
 O tempo ia passando e nada de equipamentos. E mais. Kandus estava esperando o seu visto na África do Sul. Sem visto, ela não poderia nem embarcar.
Em Luanda aproveitamos para conhecer um pouco da cidade, do grande Mercado de Luanda, um dos maiores, senão o maior da África.

Jonatan visita um dos maiores mercados a Céu Aberto, 
o Roque Santeiro em Luanda. (Já podem imaginar o por quê do nome.)

Eles instalaram uma antena para assistirmos a Novo Tempo. Dê uma olhadinha como eles colocaram a antena no telhado do apartamento. O lixo servia de calço para a antena. O mais interessante, funcionava.
Domingo, segunda, terça, quarta. Parecia que o Projeto Hope Angola não ia acontecer.
Nas palavras da Kandus:
“Que semana nós tivemos. Vimos muitos milagres na quarta, na quinta e sexta-feira.
Quinta foi altamente estressante, mas Deus nos deu graça em abundância. Eu só cochilei na noite de quarta-feira imaginando o que fazer: interromper o projeto ou levá-lo adiante. Deus e eu conversamos bastante durante aquela noite. Eu li e reli e compartilhei com nossa equipe o texto de Romanos 5:1 substituindo a palavra dificuldades por sofrimentos no verso 3. E esta promessa “A esperança não nos desaponta...” tocou na minha cabeça o dia todo!
Todas as orações dos santos de todo o mundo realmente ajudaram o trabalho maravilhosos do Céu. Levar o equipamento de iluminação e gravação comigo era a melhor solução possível. Louvado seja Deus!
Às 9:00 de quinta-feira Deus abriu as portas de forma milagrosa nos colocando em contato com um dos chefes das linhas aéreas TAAG (Companhia aérea da Angola) que tinha voltado de férias e era o seu primeiro dia de trabalho. Ele estava muito solícito e disse que tentaria nos ajudar (somente ele poderia ter feito o que fez.)
11:00, finalmente consegui receber o meu visto via fax no aeroporto. Eu deveria pegar o original no aeroporto de Luanda.
Tomamos toda aquela bagagem e despachamos. Felizmente, Minha cunhada e meu sobrinho estavam comigo e pudemos dividir a bagagem entre nós, com isso o valor que pensávamos pagar de excesso ficou 2/3 mais barato do que havíamos pensado.
Achei estranho terem me dado tanto peso extra sem cobrança, mas Deus estava agindo. Somente quando entrei no avião percebi o que havia acontecido. Por algum engano o meu bilhete era de primeira classe e por isso fui tão bem tratada e por isso o peso extra sem cobrança. Alguém tinha se enganado? Não. Deus sabia que tinha que ser assim. Depois de 20 e tantos anos de viagens internacionais foi a primeira vez que viajei de primeira classe. Dormi toda a viagem, pois estava exausta. Como estava agradecida a Deus pelo luxo que ele havia me dado. Foi bom dormir, porque na noite de quinta-feira dormiria apenas duas horas.
Toda a bagagem chegou sem nenhum extravio. Contaram e recontaram e lá estavam as 12 caixas com todo o equipamento. O Dr. Paiva já estava esperando no aeroporto e colocou o visto em meu passaporte.
            Depois do desembarque ainda esperamos cerca de três horas na alfândega. Graças a Deus e ao Dr. Paiva que conhece todos os caminhos legais e as pessoas responsáveis por cada departamento, finalmente os equipamentos puderam entrar em Angola.”

            Foi com alegria que recebemos parte da nossa equipe agora na casa de passagem. Dormimos um pouquinho e as quatro da manhã estávamos de pé, pois deveríamos pegar um vôo para Huambo, a segunda cidade mais importante da Angola. Ali aconteceria o Projeto Hope.

            Inesquecível para mim foi ver dezenas de pessoas querendo embarcar e uma confusão no aeroporto. Todos falavam alto e se empurravam, pois havia mais gente para embarcar do que lugares no avião. Eu saberia depois que mesmo tendo o bilhete de um avião na mão, não havia garantia de viajar. A orientação do Dr. Paiva era corra para o avião e sente. Em que lugar? No lugar que estiver vago. Os que estiverem sentados viajarão.
Apesar de toda aquela confusão o Dr. Paiva nos conduziu por outro caminho e passamos todos para trás. Realmente ele tem muita influência em seu país. Confesso que achei um pouco desonesto, mas realmente tínhamos que chegar em Huambo. E depois descobriria o por quê do ditado: “This is Africa, baby!”.

Jonatan chegando no aeroporto de Huambo

Finalmente em Huambo e o Projeto Hope tem início

            Nós chegamos de avião, mas o equipamento estava vindo de ônibus. Como não havia uma carro que pudesse transportar todo aquele equipamento. Noel, que trabalha para o Media Center Adventista na África do Sul, decidiu trazer o equipamento de ônibus. Comprou os assentos que foram necessários para colocarem os equipamentos e começou a viagem. “This is Africa, baby!”
            Noel é africano e está acostumado a fazer filmagens e transmissões no continente. Se alguém conhece o jeitinho africano de resolver as coisas, esse era ele. Foram longos 600 km por uma estrada felizmente reformada e nova. Mas Deus acompanhou o equipamento e tudo chegou a salvo em Huambo.
            Fomos visitar o Auditório do Seminário Adventista onde estavam terminando o nosso set de filmagens. E a equipe africana fez o melhor que pode. Embora não fosse o ideal, era o suficiente para gravarmos os cerca de 100 programas propostos.
            Como havia o problema de reverberação, pois o auditório tinha as paredes muito “vivas” e o eco era grande. Kandus teve a idéia de pegar os colchões dos seminaristas, que estavam de férias e espalhar por todas as paredes. A decoração não ficou boa, mas o isolamento funcionou.
            Enquanto Kandus e Larissa tinham seu primeiro encontro com os produtores, eu saí para comprar cabos para montarmos nossa iluminação. Descobri que em um país pós-guerra não é fácil encontrar tudo o que se precisa. E por isso a capacidade de improvisação tem que estar ligada.
            Mas a equipe estava super motivada. Eles assistiam aos programas Lições da Bíblia e Código Aberto, apresentados por mim e a Larissa, e por isso eles nos tratavam como velhos conhecidos. Muitas fotos foram tiradas, e muitas perguntas foram feitas.
            Eu saberia depois que este evento trouxe nova motivação para a igreja na Angola. Eu jamais imaginava que isto aconteceria. Mais e mais Isaías 55:5 soava em meus ouvidos como se o próprio Deus tivesse falado audível para mim: “...Uma nação que nunca te conheceu correrá para ti, por amor do Senhor, teu Deus...”
Dedicação do estúdio para as gravações dos programas

            Ficamos hospedados atrás da União Angolana. Todos os prédios ficavam em um quarteirão próximo à linda praça central: a União, dormitório dos estudantes, casas de obreiros, a escola, a igreja e a clínica. A praça hoje está restaurada, mas foi o lugar onde tiroteios eram constantes no período em que a guerra que assolou a região durante anos e anos.
            Para mim foi uma surpresa ficar hospedado na parte superior do prédio onde funcionou a Voz da Profecia na Angola. Realmente, eu e a Voz da Profecia somos inseparáveis.

Coral entra na igreja que preguei em um dos sábados.

            Naquele primeiro sábado em Huambo preguei em uma das igrejas, e como não poderia deixar de ser foi sobre as profecias que mostram que a volta de Jesus está próxima. Eu era o único branco da igreja, mas éramos todos iguais e tínhamos o mesmo ideal.
            Logo notaria que todas as igrejas tem o seu coral, e algumas mais de um coral. Os africanos são muito musicais. O coral sempre entra marchando pelo corredor central cantando algum hino característico deles.
            As classes da Escola Sabatina se reuniam em sua maior parte do lado de fora. E era interessante notar como eles prestavam atenção ou discutiam o assunto. E em uma classe o estudo era em português, mas em outra era em Humbundo (a língua da região). Os sermões sempre tem tradução para o Humbundo ou o Kimbundo, ou outro dialeto que se faça necessário, conforme a região da Angola.
Escola Sabatina ocorrendo no lado de fora da igreja.


Restos de Guerra
            
No sábado à tarde visitamos a universidade de Huambo. A região é linda. Muito verde, lindas planícies com árvores frutíferas ou não. Mas os sinais da guerra ainda estavam aparentes. Prédios crivados de balas, sinais de bombas e até o tanque que protegia um dos chefes da guerra ainda estava na universidade. Foi ali que Savimbi escolheu para se abrigar nos tempos de guerra.

Prédio onde morava o pastor na época da guerra. Todo perfurado pelos tiros.
           
Um pastor nos contou como era a vida deles nos tempos de guerra. Levantavam cedo e iam para um buraco no chão, porque às 8:00 da manhã os aviões iniciavam os bombardeios.
            Ele dizia: “Parecia aqueles filmes de guerra que a gente vê na televisão. Só que nós estávamos nele.”
            Os cultos, no sábado, se iniciavam às 6:00 da manhã, porque às oito todos tinham que já estar escondidos.
            As marcas também permaneciam na mente e no coração.
            Em uma noite, durante o jantar, a TV estava ligada na CNN. As notícias eram sobre a guerra em Israel. Um jovem pastor que estava conosco pediu que mudasse de canal. Perguntamos o por quê, e ele disse: “Eu não posso assistir isso, eu perdi minha irmã e meu irmão durante a guerra. Isso ainda dói.”
            Todos têm histórias sobre a guerra. Sua história pessoal. Alguns cresceram no meio das bombas e dos tiroteios. Outros perderam filhos e família durante a guerra. Para nós é impossível termos idéia real do que eles sofreram e ainda sofrem com o longo período de guerra que atravessaram.
            Um dos irmãos nos contou como um sábado ele se atrasou e já era perto de sete horas quando foi para a igreja. De repente, sentiu como uma pedrada atingindo sua fronte. E logo que passou a mão pela cabeça percebeu que havia sido atingido por um tiro.
            Como tudo parecia bem, com exceção do sangue que corria sobre sua camisa, ele decidiu ir para a igreja assim mesmo. Ele pensou: “Se é para morrer, vou morrer na igreja.”
            Ao entrar na igreja, as pessoas olhavam para ele, mas estavam acostumados a esse tipo de cena e aguardavam o momento em que ele morreria. Mas não morreu.
            Levaram-no para a clínica e que surpresa: a bala não havia penetrado sua cabeça. Em suas palavras: “Deus colocou a sua mão na minha cabeça e impediu a bala de entrar.”
            Durante mais de duas horas estivemos ouvindo essas tristes histórias. Algumas eram de arrepiar. Outras mostravam a maldade do ser humano quando dominado pelo ódio.
Foram tempos difíceis. Não havia o que comer. Um deles disse que certo dia recebeu um dinheiro que não esperava receber. Foi então ao mercado (ao ar livre) e comprou um canudinho de sal e um canudinho de óleo. Você pode perguntar: “que canudinho?” Como sal e óleo eram artigos de luxo, eram vendidos dentro de um canudinho de refrigerante. Uma quantidade ínfima, mas ele disse que foi a primeira vez em mais de um ano que eles provavam uma comida com sal e óleo.
Vendo o quanto sofreram Larissa perguntou se eles não ficaram com raiva de Deus. E a resposta foi emocionante:
“Raiva?! Como poderíamos ficar com raiva de Deus? Deus era tudo o que tínhamos e isso os soldados não poderiam nos tirar.”
Havia um hino que eles cantavam todos os dias, em todos os cultos.
Perguntamos: “Mas sempre o mesmo hino?”
“Sim, não podia ser outro mesmo.”
No final da entrevista, com lágrimas no rosto cantaram:
“Nas agruras desta vida...”

As gravações começam
Cenário sendo preparado

            Kandus, sua cunhada Julie e outros foram aos mercados africanos para comprar material para o cenário. Também procuraram vasos ou outro material que pudessem tomar emprestado para utilizar na cenografia.
            Achar as coisas em Huambo não era fácil. O Pr. Vinte visitou cinco lojas diferentes em busca de linha de pesca. Felizmente ele já havia comprado alguns móveis que foram usados nos diferentes programas que faríamos ali.
            Saíamos para comprar tinta para pintarmos o cenário. Kandus se assuntou com o preço de um galão de 18 litros de tinta: inacreditáveis U$ 260,00.
            Como a Kandus mesmo disse: “Vivemos uma caminhada pela oração, pois esta é a cidade mais limitada em termos de encontrar as coisas de qualquer projeto que eu já participei.”
            Embora, os Angolanos sejam pessoas maravilhosas, muitas vezes temos que falar mais de uma para termos a ação. Kandus pedia e pedia por um carpinteiro, que só apareceu três dias depois.
            Como montar cenários diferentes em um lugar tão difícil? Foi um desafio para a Kandus, mas ela se saiu maravilhosamente bem. Na verdade a caminhada de oração valeu. Deus a ouviu todo o tempo.
            Depois de muito tempo sem trabalhar com iluminação chegou a hora de voltar a me lembrar o que é Key Light, Fill Light e Back Ligth. Na verdade, os nomes não importavam, mas sim que ficasse bonito.
            Quando nem tudo funciona como você quer, você usa a criatividade e trabalha com o que tem. E era o que fazíamos.
            Também tinha que treinar os câmaras, pois para alguns seria a primeira vez que estariam filmando alguma coisa. Nomeei um auxiliar para a iluminação e o denominei “lusófago”. Eles riam quando eu chamava: “Cadê o Lusófago?”
            Mas chegou o dia que poderíamos dedicar o estúdio a Deus. Tivemos um lindo culto, com hinos e oração pedindo a Deus que abençoasse o trabalho que seria feito naquele lugar. Certamente Deus abençoou.
            Os programas foram sendo gravados. Os dias eram de intenso trabalho, e algumas vezes cheguei a estar até as 3:00 da manhã para deixar a luz preparada para o dia seguinte. E o “Lusófago” sempre ao meu lado. Bom companheiro esse meu amiguinho angolano.

Jonatan e Kandus durante as gravações dos programas na Angola.

            Um detalhe que é bom compartilhar. Huambo é uma cidade que tem um clima muito agradável. De manhã é um pouco mais quente, mas não um calor intenso, e à tarde temos uma chuvinha que refresca um pouco mais.
            O problema é que não podíamos ter chuva no horário de gravação. O telhado de zinco produzia um som muito alto com o bater da chuva no teto. Assim a nossa oração era: “Senhor, por favor, não deixe que chova durante as gravações.” E Deus foi maravilhoso. Em nenhum momento fomos interrompidos pela chuva. Choveu, mas sempre em horários em que não estávamos em gravação.

Foto com a equipe masculina no cenário dos programas de crianças


Deus providenciou um técnico de áudio

            Gravamos dezenas de programas, mas o nosso técnico de áudio era um voluntário e não um especialista. Agora teríamos que gravar na próxima semana programas musicais. O áudio era fundamental. Onde encontraríamos uma pessoa experiente e que pudesse estar conosco durante todos os dias de gravação?
            Naquele final de semana o cantor Leonardo Gonçalves se apresentaria em Luanda e como sempre faz, trouxe o seu técnico de áudio, Felipe Mudo.
            Fizemos alguns telefonemas e ele aceitou participar do projeto. Foi muito bom reencontrar o Mudo (o único Mudo que fala) e ter a sua companhia na gravação dos programas finais.
            Foi emocionante ver aqueles corais, grupos, quartetos e músicos chegarem, todos em seus lindos trajes coloridos para a gravação. Alguns vieram de motocicleta cruzando o país por mais de 700 km apenas para participar da gravação.

Grupo musical que participou das gravações

            E na despedida final, a emoção tomou conta de todos nós quando um coral entrou salão adentro e enquanto cantavam iam colocando sobre cada um de nós uma de suas roupas típicas nos fazendo parecer um pouco mais africanos.
Todos vestidos com seus trajes angolanos. 
Na foto vemos, Kandus, Larissa, Jonatan, a cunhada da Kandus, 
Spencer, e Felipe Mudo, o técnico de áudio que Deus providenciou.


Uma Visita ao Bongo

            Creio que uma das visitas mais interessantes foi ao nosso colégio no Bongo. Ali, no passado funcionou o colégio interno com sua faculdade de Teologia e também o nosso Hospital na região.
            A estrada que leva até a Missão do Bongo tem uma paisagem lindíssima. Ali ficava o antigo reino Humbundo. Algumas formações rochosas tornam o lugar mágico e misterioso. Olhando para um lugar tão bonito, parece quase impossível acreditar que ali foi tocado pela guerra. Mas foi.

Antigo prédio de aulas da Missão do Bongo, hoje desativado.

            Ao chegarmos ao nosso colégio, notamos os sinais da guerra: prédios destruídos, equipamento espalhado e com o mato crescendo dentro. Sinais de destruição e desolação. O Pr. Alexandre nos contou como alguns pioneiros sofreram naquele lugar, inclusive ele próprio. Ele falou um pouco da história do Pr. Ronaldo Oliveira e sua família, que chegou à tarde, e logo à noite foi preso e levado de um lado para outro do país, caminhando centenas de quilômetros até ficar em um campo de concentração sofrendo as agruras da guerra.

Pr. Alexandre conta a Larissa como o Pr. Ronaldo Oliveira 
foi preso na primeira noite em que chegou. Na foto
 ele está em frente da casa onde o Pr. Ronaldo Oliveira foi levado preso.


Antigo hospital destruído pela guerra.

            Mas também ouvimos dos milagres que ali ocorreram. Como Deus em alguns momentos providenciou o maná para que aqueles irmãos tivessem com que se alimentar. Curioso eu perguntava:
“Aonde caía o maná, irmão?”
“Debaixo daquela árvore.”
“Não poderia ser algo que caía da árvore?” Eu perguntava de novo.
E a resposta vinha: “Mas, veja que ali tem outra árvore do mesmo tipo, mas só caía debaixo dessa árvore.”
“O senhor comeu do maná?”
“Sim, comi.”
“Que gosto tinha?”
Eu parecia uma criança que não para de perguntar. Uma terra de sofrimentos, proporcionado pelo inimigo de Deus, mas uma terra de milagres onde o poder de Deus se manifestou mais uma vez, mostrando que Ele se importa com os seus filhos.
O sonho dos nossos irmãos angolanos é ver esse colégio em funcionamento de novo. Seus prédios restaurados e os alunos nas salas de aula estudando. Se possível o hospital em funcionamento. E os milagres que aconteceram nesse hospital se repetindo.

Igreja da Missão do Bongo no sábado de manhã

            Quando voltamos para o Brasil, dormimos uma noite no alojamento da igreja na África do Sul. Depois de um mês tomaríamos um banho quente. O lugar, na África do Sul, nos pareceu um hotel cinco estrelas. Agradecemos ao Pr. Gilberto Araújo que nos proporcionou essa noite tão agradável na região que ele tem atuado como missionário.


Voltei a orar a Oração de Jabes

Ao retornar para o Brasil decidi voltar a orar a Oração de Jabes em minha comunhão matutina. A história de ir para a Rússia havia ficado no passado e talvez Deus tivesse um plano para mim, aqui mesmo no Brasil.
Decidi intensificar o meu trabalho na edição do livro “Chegou a Hora”.
Mas naquele mês houve uma grande reunião no Sistema Adventista de Comunicação. Na verdade, quando nos buscaram no aeroporto, junto conosco vieram pessoas de outras partes do mundo para essa reunião.
Como estava voltando de um intenso mês de trabalho, não me envolvi com essas reuniões. De fato estive presente apenas uma vez, a pedido da Kandus, para apresentar um vídeo sobre a África.
Mas em uma sexta-feira, o Pr. Brad Thorp me chamou. Ele me apresentou o Pr. Daniel Reband.
“Este é o Pr. Daniel Reband, da Divisão Euro-Asiática, e ele quer conversar com você.”
A conversa girou em torno de meu chamado para a Rússia. E o que eu pensava que estava morto, não estava.
Conversamos por cerca de uns 30 minutos. Ele quis conhecer a minha esposa, Priscila, e o meu filho Samuel. Contou um pouco dos sonhos e perguntou-nos se aceitaríamos trabalhar naquela parte do mundo.
A resposta foi sim, mas confesso que não acreditava que seria chamado.
O próprio Pr. Daniel nos disse que aquilo era apenas uma conversa informal, pois a decisão seria tomada por uma comissão.
“Se o chamado não chegar", disse ele, "aceite isso como a vontade de Deus.”
Fiquei tranqüilo, mas as palavras de Isaías 55:5 voltaram à minha mente:
“Eis que chamarás a uma nação que não conheces, e uma nação que nunca te conheceu correrá para ti, por amor do Senhor, teu Deus, e do Santo de Israel; porque ele te glorificou.”

Um longo processo até o dia da viagem para a Ucrânia

Não pensava que o chamado chegaria, até que no final do mês de março, veio um telefonema da Conferência Geral solicitando o nome completo de minha esposa para ser enviado para a Divisão Euro-Asiática.
Eu e minha família voltamos a conversar sobre o assunto. Seríamos chamados?
No dia 8 de abril de 2009, o secretário assistente da Divisão Sul Americana, Daniel Costa, me solicitou que preenchesse uma série de dados em uma página web da Conferência Geral. Muitas informações foram colocados ali. O longo processo do chamado estava apenas começando.
No dia 17 de abril recebi uma série de formulários que deveriam ser preenchidos por um médico depois de um check-up completo, meu e de minha família. Foram diversos meses até ter todos os exames prontos e aprovados.
No entanto, foi apenas no dia 21 de maio de 2009, que recebi oficialmente o chamado e o voto através do Pr. Marlon Lopes, diretor do Sistema Adventista de Comunicação.
No dia 4 de junho se iniciaram a longa bateria de exames que comporiam o nosso check-up. Um longo formulário chamado Health Evaluation deveria ser preenchido pelo médico e enviado à Divisão Sul Americana onde seria votado.
Eu não imaginava que demoraria tanto, e que só no dia 16 de novembro viajaríamos para o nosso novo campo de trabalho.

Decidi falar sobre o projeto “Chegou a Hora”

Embora tivesse falado em alguns poucos lugares sobre esse assunto, do porque creio que Cristo voltará nos nossos dias, decidi que era hora de pregar nas igrejas abertamente falando sobre a proximidade da volta de Jesus.
Também decidi, fazer de tudo para que o livro fosse finalmente publicado. E depois de ler no livro "Patriarcas em Profetas" que Noé gastou tudo o que tinha na construção da Arca, senti que deveria por o meu dinheiro na publicação do livro.
Durante oito manhãs expus o assunto diante dos companheiros mostrando a eles como Ellen White mostra claramente que Cristo voltará à terra no final do período de 6.000 anos de domínio do pecado neste planeta. Mostrei ainda que os próprios livros de Ellen White contêm a chave que revela o início da contagem do período dos 6.000 anos e com isso podemos saber a proximidade da data da volta de Jesus. (veja o meu Blog: jonatanconceicao.blogspot.com )
Como o livro não saía decidi disponibilizar o livro em forma de apostila. Creio que umas 15 pessoas se interessaram na Novo Tempo. Vários já tinham lido pois eu havia emprestado ou dado.
Foi assim que durante todos aqueles meses preguei quase todos os sábados, de manhã e muitas vezes à tarde, sobre esse assunto.
Alguns achavam que eu não deveria vir para a “Rússia”, pois a mensagem tinha que ser dada no Brasil.
O tempo passava o editor se demorava em aprontar o livro. Depositei algum dinheiro na conta dele para ver se a coisa agilizava, mas não adiantou.
O dia da minha viagem se aproximava. Percebi que não daria mais tempo para que o livro fosse publicado. Decidi publicar na internet, em forma de Blog. Ainda estou atualizando, mas muitos tem acessado o Blog e se inteirado do assunto. Que Deus use o material que Ele me deu no momento em que Ele desejar.

O Mês Pré-embarque

Chegamos ao último mês no Brasil. Visitamos nossos pais e demos o nosso tchauzinho a todos. Compramos malas. Tentávamos nos aprontar, mas para uma mudança tão radical, o tempo parecia muito curto.
No dia 9 de Novembro nos mudamos com os nossos móveis para Nova Friburgo, a nossa casa brasileira. Foi muito bom dormirmos duas noites em Friburgo. Dias chuvosos e friozinhos. Lugar tranqüilo, com uma água maravilhosa. Aquele lugar tinha sido presente de Deus e por isso gostávamos tanto de lá. Coisas importantes em nossa vida aconteceram naquele lugar.

A casa que Deus nos Deus em Nova Friburgo

Eu estava em paz, talvez até demais. Vinha no meu pensamento o texto de Isaías 55:12: “Saireis com alegria e em paz sereis guiados... e será isso glória para o Senhor e memorial eterno que jamais será extinto.”
Muitas coisas teriam que ter sido feitas naquela semana, mas muita coisa faltou. Mas minha esposa foi uma lutadora e graças a ela, para mim, posso dizer que tudo saiu perfeito. As coisas que faltaram a gente dá um jeitinho.
Também tenho que agradecer ao Sistema Adventista de Comunicação pelo apoio e o auxílio (inclusive financeiro) nestes últimos dias em São Paulo.
Naquela segunda-feira, dia 16 de Novembro, fiz meu último culto na capela do SISAC. Foi um adeus, pois creio que nunca mais trabalharei de novo ali. Foram mais de 20 anos trabalhando na Voz da Profecia, Sistema Adventista de Comunicação, TV Novo Tempo, TV Nuevo Tiempo. Boas e más lembranças. Tenho que agradecer as oportunidades que Deus me deu ao trabalhar ali. Vi o que ninguém viu, senti o que ninguém sentiu. 
Tive o privilégio de trabalhar na Voz da Profecia quando o Pr. Roberto Rabelo ainda tinha o seu escritório na nossa sede e todos os dias estava lá.
Foi um grande privilégio trabalhar com o Pr. Roberto Conrad. Ainda me lembro com saudades das gravações dos programas Encontro Com a Vida no nosso pequeno Estúdio em Curitiba.
O próximo orador foi o Pr. Hélio Carnassale. Grande companheiro de IASP e de trabalho.
Depois veio o Pr. Ronaldo Oliveira, com ele experimentamos a transição Voz da Profecia para Sistema Adventista de Comunicação.
A seguir veio o Pr. Neumoel Stina, que colocou todo o seu coração no reerguimento da Voz da Profecia, e conseguiu. Mais de 1400 emissoras de rádio transmitiam o programa em sua época. E na TV iniciamos o programa a Voz da Profecia para a TV. Todos os domingos na TV Bandeirantes.
O outro orador foi o Pr. Montano de Barros. Tive o privilégio de produzir o programa A Voz da Profecia com ele por alguns anos.
E que dizer do último orador com o qual eu trabalhei?
Já havia trabalhado dom o Pr. Fernando Iglesias quando ele ainda cantava nos Arautos do Rei, e agora tive o privilégio de trabalhar com ele
Participei do início do pequeno estúdio de TV da igreja Adventista em Curitiba. 
Participei da primeira transmissão ao vivo da igreja para fora do Brasil, no aniversário da Voz da Profecia, em 1993.
Participei da primeira transmissão ao vivo da igreja de fora do país para o Brasil. Foi em 1995, quando transmitimos as reuniões da Conferência Geral da Holanda para o Brasil.
Participei do inicio da TV Adventista no Brasil. Tive o privilégio de dirigir diversos departamentos dentro dessa estrutura até ser o diretor da TV Novo Tempo e da TV Nuevo Tiempo.
Creio que um dos privilégios que eu qualificaria como grande, foi participar do programa Lições da Bíblia até 2009. No mês de maio iniciamos um Blog e eu pude ver como as pessoas usavam essa ferramenta. Encerramos o ano com mais de 1.000.000 de acessos. Louvado seja o nome do Senhor!
Naquela segunda-feira, o Pr. Ronaldo Oliveira, antigo orador da Voz da Profecia, me ligou. Queria me desejar uma bênção especial para o meu trabalho.
Ele talvez não saiba da importância desse telefonema, mas ele está no meu coração como um dos grandes homens que Deus tem usado em seu trabalho. Participei junto com o Pr. Ronaldo de alguns momentos difíceis em sua vida. Um deles, quando teve que encerrar o programa “Está Escrito” para São Paulo, por falta de patrocínio. Interrompemos a gravação, porque ele não agüentou e chorou.
Anos depois, já como orador da Voz da Profecia, teve que sair e dar o seu lugar a outro, e também sofreu, pois ele realmente amou a Voz da Profecia e pensava que iria se aposentar ali, assim como o seu antecessor Pr. Roberto Rabelo.
Pr. Ronaldo você é uma pessoa especial. Deus o está usando e abençoando muito mais do que se estivesse apenas na Voz da Profecia.
Nesse dia outra ligação. O Pr. Neumoel Stina, outro ex-orador da Voz da Profecia me telefonou para desejar que Deus nos abençoasse. Muitas coisas Deus tem feito através do Pr. Neumoel. Me lembro de quantos programas gravamos juntos. Quantas vezes me emocionei com os sermões e os apelos dele enquanto gravava. Momentos que estão na minha memória. E receber sua ligação foi algo muito especial para mim. Também sei o quanto ele sofreu ao sair da Voz da Profecia, pois ele amava aquele trabalho. Deus permite que algumas coisas aconteçam, mas continua a abençoar a pessoa em outro lugar. E certamente o Pr. Stina tem sido uma bênção. Seus sermões nos sermões, em fitas ou em CDs e seus livros tem levado muitas pessoas a um encontro pessoal com o Criador.
Outro que telefonou foi o Sacha, o Alexandre Ostrovski. Companheiro que me acompanhou durantes muitos e muitos anos. Sacha, encontrei outros Sachas aqui, mas você é único. Sacha, você é 10.